quarta-feira, 23 de março de 2011

A dor e o alívio.



A dor é uma das poucas coisas que igualam todos os seres humanos em uma única comunidade. É uma sensação horrorosa e, principalmente alguém que já sentiu intensamente seus nefastos efeitos, compadece-se com grande facilidade com a agonia dolorosa do outro.

Quando falo em dor estou me referindo à física. De maneira muito geral, dor é uma sensação transmitida ao cérebro principalmente pelas vias nervosas. Não me aventurarei a fazer mais nenhuma especulação biológica sobre ela, pois seria uma temeridade ainda maior do que a já cometida.

Por incrível que pareça existe uma história da dor. Na antiguidade, ela era relacionada às ações dos demônios. Os primeiros que vincularam a percepção da dor com o sistema nervoso e o cérebro foram os gregos, através da sábia e inigualável figura do filósofo Aristóteles.

Hoje, com o avanço da medicina, a dor já não é vista como o mal a ser eliminado, mas como efeito de uma causa a ser diagnosticada. Um médico responsável receita analgésicos, para aliviar os incômodos de seu paciente, e também pede exames para verificar qual a razão biológica do desconforto.

Semana passada senti a alucinante cólica de rim. Transpirava um suor frio e chegava a desferir coices no ar! A tragédia dos atendimentos hospitalares, pelo menos nos momentos de dores agudas, são as famosas perguntas sobre endereço, idade e estado civil. Que horinha mais imprópria para perguntas, não acham?

Fui medicado com um, três mil vezes abençoado seja, buscopan, que foi aplicado na veia da minha mão. Quando o auxiliar de enfermagem tirou a agulha da pele, a dor já tinha ido embora. Que sensação maravilhosa! Passei por um exame de urina e estou passando por outros exames. Desconfia-se de cálculo renal, ou seja, estou bebendo muita, muita e muita água.

No dia em que passei por essa crise, no momento em que fui deitar com a intenção de dormir, pensei: - Como é bom não sentir dor. Entretanto, para pensadores como o grande Arthur Schopenhauer, a felicidade é uma grande ilusão e apenas a dor é real. Porque é através dela que tomamos consciência da nossa existência. Passamos o dia todo em cima dos pés, só nos percebemos a realidade dele, exatamente quando há um calo bem latejante nos perturbando.

Prefiro a ilusão!

terça-feira, 15 de março de 2011

Bolsa feminina: um buraco negro no universo masculino


Alguém já parou pra notar o quanto uma mulher demora pra escolher uma bolsa? Ficam horas e horas pra ficar na dúvida entre umas cinco e, depois que fazem a mais do que avaliada opção, o resultado é um dolorido arrependimento. Não é remorso pela suposta alternativa errada, mas por não ter levado, no mínimo, três! É engraçado.

A bolsa é um acessório muito comum entre as mulheres. Com diferentes tamanhos e estilos acabam sempre aos montes nos guarda roupas femininos, pois existem modelos adequados para diversas circunstâncias, o que, normalmente, acaba sendo a justificativa para tanta escolha e bolsa.

Na realidade me divirto com esse ritual protagonizado pelas mulheres. Uma vez fui com minha namorada comprar bolsa, pois ela ne-ces-si-ta-va de uma bem pequena e preta para combinar com um vestido e ir em paz consigo mesma num casamento. Achamos várias, mas nenhuma estava boa. Até que num momento, não mais que um momento, encontrou a tão esperada bolsa. Aleluia! (Cá entre nós, praticamente idêntica às outras outrora desprezadas). Acho que o cansaço foi fator mais determinante do que o modelo.

Até o século XIX, tanto os homens quanto as mulheres, usavam as bolsas presas na cintura. Deus do céu a pochete era moda! Argh! No século XX as mulheres colocaram alças nas delas e as penduraram nos ombros, ao passo que os homens, reduziram seu volume dobraram e enfiaram nos bolsos (carteiras). Evolução da espécie...

Qual a relação entre os buracos negros e as bolsas das mulheres?

Antes de qualquer filosofia é melhor um pouquinho de física. Os buracos negros são pontos no universo que tem tanta matéria que nem a luz consegue sair desses lugares. Imaginem o perigo de um quarto tão cheio de bugigangas onde nem conseguimos ver a iluminação. Há também os buracos negros formados depois da queima completa de uma estrela, com massa de três vezes maior que a do sol, ou seja, depois dela queimar todo o seu gás passa a queimar a si mesma e desaba sobre si mesma.

Então! Essas grandezas físicas que ficam penduradas nas mulheres são dotadas de uma variedade infinita de objetos. Tudo se encontra nas bolsas! Os registros são múltiplos: cinzeiro; alicate de pressão; controle remoto; ração pra peixe de aquário; corda de violão; garantia de bateria; garfo; e por aí vai...

Inocentes homens prestem atenção. Jamais fareis a seguinte pergunta para uma mulher: será que você não carrega nenhum amante dentro da bolsa? Porque a resposta pode ser: ter eu não tenho, mas o telefone de vários sim!

quarta-feira, 9 de março de 2011

Os povos e as praças.



As praças são lugares de confraternizações de uma comunidade. As crianças se divertem jogando bola, brincando no parquinho ou correndo pelas gramas. Os vendedores ambulantes de pipoca e caldo de cana lucram seus valorosos reais. Os idosos distraem a solidão em disputadas rodadas de truco. Adolescentes skatistas deslizam suas velozes rodas pelo liso pavimento...

Existe uma praça que marcou muito a minha infância. Ela fica em Assis – SP, na Avenida Dom Antonio, bem defronte à diretoria estadual de ensino. Nela o saudoso avô levava todos os seus quatro netos para brincar. Eu, meu querido irmão e os não menos queridos primos; andávamos de bicicleta e construíamos castelos nos bancos de areia. Essa é uma feliz recordação que tenho de meu avô, pois quando o bom senhor faleceu eu tinha apenas onze anos.

Ano passado a praça passou por uma reforma que descaracterizou todo o charme implícito desde os anos oitenta. Fiquei, num primeiro momento, bastante revoltado em ver os tratores destroçarem o paraíso de minha feliz infância, entretanto, depois de uma necessária reflexão, entendi que as mudanças são inevitáveis e que a juventude de hoje precisa de um lugar mais adequado para a atual realidade.

Esses locais comunitários também desempenham uma função eminentemente política. No Movimento Diretas Já, o vale do Anhangabaú na cidade de São Paulo, teve um papel importantíssimo, pois tinha condições de receber mais de um milhão de pessoas. Com uma massa de gente desse tamanho, não há militar que se mantenha no poder.

Mês passado aconteceu a mesma coisa, só que a cidade é o Cairo, o país é o Egito e a praça se chama Tahrir. O interessante é que o significado dessa palavra árabe, em português, é liberdade. Ali, os egípcios lutaram pela democracia por várias semanas, ainda hoje muitos permanecem por lá, para garantirem que a junta militar fique apenas o período suficiente para a organização de uma eleição para presidente. Preocupação mais do que justificada, pois no Brasil ficaram por vinte e um anos com a mesma intenção... Até todo mundo ir pro Anhangabaú!

Na Líbia, os protestos contra o ditador Muammar Khadafi, tem se concentrado na cidade de Benghazi e na Praça Shajara. Nela os rebeldes líbios que lutam contra a ditadura em tal país manifestam, lutam, gritam e morrem pela democracia. E quando esse pulha do Khadafi for escorraçado de lá, a praça será o emblema de um povo em nome de uma irmandade nacional mais justa.

Jean-Jacques Rousseau já dizia que a liberdade pode ser apenas conquistada, jamais recuperada. Acredito que o início da segunda década do século vinte um pode simbolizar um marco importante: a consciência mundial de que não somos livres politicamente. Há algo de monstruoso, nos bastidores, que sustentou o egípcio Hosni Mubarak, que ainda mantém Khadafi e que segura todos os governos federais espalhados pelo mundo. É contra esse monstro que os povos devem lutar.

Agora entendem porque as praças são, estrategicamente, abandonadas no Brasil? Elas unem as pessoas contra as injustiças que sofrem no cruel cotidiano.

Às praças!

quarta-feira, 2 de março de 2011

O luto das palavras.


Querer viver para sempre é um sentimento juvenil. Na medida em que envelhecemos, para quem não se acostuma com a idéia de que um dia vai contar seu último segundo no planeta, pelo menos vai aceitando de que será a personagem central de um velório. Tudo passa e uma hora, fatalmente, nós também passaremos.

Não gosto de refletir sobre um tema tão pesado quanto a morte, entretanto, uma força muito maior que meu desejo faz com que dedique minhas desastradas e tristes palavras para tamanha abordagem. Afinal, o último domingo passou o grande Moacyr Scliar.

Agigantou nossas letras pela sua própria humanidade. Fez-se porta-voz da cultura judaica em nossa pátria. Provou pra todo mundo que não é preciso se fazer de coitado, depois da Segunda Guerra Mundial, para falar da história do povo judeu e nem ficar lamentando o Holocausto, pois está claro que seja qual for o ataque à integridade humana ela é digna de repulsa e condenação.

Lutou sim contra as mazelas sociais, seguindo o exemplo incontestável de Che Guevara, professando a bela função médica especializando-se em saúde pública. Militou na literatura contra a opressão de um besta regime militar e, através de sua fina habilidade com a língua portuguesa, traduzindo em suas páginas as diversas possibilidades dos anseios humanos.

Não está mais na moda querer salvar o mundo; pensar numa política que seja humana e igualitária; no bem da sociedade como um todo; querer acabar com a fome, a miséria e a corrupção e ver no outro a mesma dignidade que tanto vemos em nós mesmos. O que fazemos em nossos dias é defender um escasso salário em detrimento da nossa vergonha moral.

Um lugar como esse não merece um imortal como Moacyr Scliar, pelo contrário, precisa dele.

Sim! Ele é imortal! Não porque uma academia reconheceu, mas pela sua perseverança. Por ser o único soldado do exército de um homem só e jamais desistir. Sua resistência sobrevive, mesmo antes de seu nome virar troféu e prêmio de concursos literários, ela já figurava nas práticas que motivam os grandes realizadores.

Estou planejando, ao lado do amigo, filósofo e publicitário Sanabria, uma viagem pela América Latina com o objetivo de passar nas cidades onde vivem e viveram os grandes escritores de nossa cultura. No percurso, o projeto era passar em Porto Alegre para conversar com Moacyr...

Por vezes agradeci a oportunidade de não ter vivenciado a dor do dia da passagem de John Lennon. Hoje as lágrimas são para Moacyr Scliar.

Descanse em paz.