domingo, 22 de abril de 2007

Sobre as manifestações.

Acredito que um dos temas mais relevantes em política é o meio que possibilita a passagem da idéia à prática. A velha noção de práxis, em bom filosofês a prática que orienta a alteração das ideologias, torna-se algo obsoleto propiciando a proliferação de políticas totalitárias. Tal definição deve ser superada e redefinida para questões futuras. Em algum rincão dessa maravilhosa rede de computadores já disse alguma estultícia a respeito, algo sobre o idealizador não ter comprometimento nenhum com a prática. Mantenho a opinião! Realizar a prática partindo de uma teoria é esforço que pode ser feito ou não por qualquer pessoa, desde que conheça seus conceitos, sendo ela o mentor ou não. Então, nesse dilema faz-se maior relevância a questão do conhecimento pleno de uma ideologia pára que ela possa se fazer no plano concreto. Para irmos além da exortação do oráculo, a condição necessária pressupõe também o conhecimento de algo para fora de si mesmo, ou seja, a teoria.

Vemos nas universidades públicas do estado de São Paulo, um indicativo de greve, referente à atitude do governo tucano em impor um gerenciador para o repasse de verba para a educação. O estranho desses acontecimentos é o seguinte: vemos algo que era imoral, o fato de cercear a autonomia da universidade para a administração de suas verbas, tornar-se moral, por uma medida do governo estadual; essa transição do imoral para o moral, foi realizada de forma autoritária, ou seja, desvalorizando princípios elementares da democracia. Contudo, contraditoriamente, a maneira que se pensa em manifestar oposição à ela, é plenamente democrática, posto que as greves são direitos adquiridos e previstos por lei. Ora, se a transição do imoral para o moral foi satisfatoriamente realizada pelos administradores públicos, por vias autoritárias, por que não se pode assumir essa mesma postura na forma de como reagir a tais arbitrariedades? Não estou fazendo apologia ao discurso totalizante nas reivindicações populares, entretanto, temos que pensar uma forma de reclamar diferente das já decrépitas greves. Pôxa vida! No Brasil até o presidente já fez greve! Está mais do que na hora de revermos os conceitos de manifestações, pensando outras vias possíveis de termos nossas vozes reconhecidas pelo estado.

Terça – feira passada, dia dezessete de abril, dentro das manifestações do Abril vermelho do movimento dos trabalhadores sem terra, alguns ativistas ocuparam vinte e cinco praças de pedágio do estado do Paraná. É uma via possível que não a greve? Não creio, pois se trata de atos isolados que partiu da ação rumo à teoria (práxis). Esse tipo de atitude impensada que visa somente aparição na imprensa, tem curto alcance e fortalece o discurso dos opositores do movimento, seja ele qual for. A única coisa que podemos ver de positivo nessas ações é o ineditismo. Posto que já não é mais novidade e que a realidade de sua ação enfraquece as articulações sociais, conclui-se que é um engano insistir nessa qualidade de manifestação.

É notório nos movimentos populares com engajamentos coletivos que reivindicam ao estado democrático de direito, uma porção da propriedade nacional e não direitos trabalhistas e educacionais, um espaço muito fértil para a elaboração de teorias que visem uma via concerta para se abrir um dialogo com o poder instituído. Uma universidade, por exemplo, que paralisa suas atividades em nome de condições de aulas e salariais para seus funcionários, tem mais chance de ver sua voz representada em uma greve. Agora, um sem terra ou um sem teto, vai fazer greve de quê? Para descobrirmos uma teoria que de fato seja compatível com a realidade, tais movimentos propiciam uma discussão muito relevante e profunda. Contemplando idéias que se objetivam na prática, fica mais próximo um ideal coletivo do que pensarmos estritamente para a ação, afinal, os “ismos” do século XX atestam o engessamento que pode ocasionar algo focado tão somente na ação.

Que voltemos então nossas energias para o estudo das grandes idéias que visem a prática, para que essa seja bem justificada e não incorra em repetitivos equívocos. Voltar os olhos somente para a ação pode ser condicionador. Voltar os olhos somente para a teoria pode ser aristocrático. O que fazer então? Começar a pensar já é uma boa escolha!

domingo, 15 de abril de 2007

Policarpos do século XXI.

O cinema é a estética massificada contemporânea por excelência. É a forma em que nossos convivas no mundo, em sua maioria, se relacionam com a natureza humana em uma representação de gênios criativos. Podemos identificar nas condições de criação artística, em todos os tempos da sociedade, o reflexo de suas aspirações ideais e produtivas. Vemos a dificuldade dos diretores em viabilizar concretamente seus roteiros devido ao pouco investimento na técnica cinematográfica, ou seja, muitas idéias na cabeça e poucas câmeras nas mãos (essa dificuldade das câmeras será sanada alguns parágrafos em diante). Enfim, o cinema é um privilegio para poucos, tanto pela dificuldade material de se fazer o filme quanto pela mesma dificuldade que os menos favorecidos tem de vivenciar o que chega até nossa telas, portanto, o cinema é a arte contemporânea massificada por excelência? Atende ao sacrifício da aura da obra de arte, colocada por Walter Benjamin, em nome de uma suposta consciência de classe? Como “brasilisar” uma evolução tecnológica importada?

O dia catorze de abril de dois mil e sete foi importante para a cultura assisense. Foi exibido no cinema municipal o filme Cafundó, dirigido por Paulo Betti, e, no final da exibição, tal diretor veio inundar o auditório do cinema com sua sabedoria cinematográfica. O filme foi estrelado pelo ator Lázaro Ramos, que interpretou o místico João de Camargo, ex escravo que fez a fama de milagreiro na região de Sorocaba; narra a história biográfica desde a infância escravocrata, passando pela lei Áurea, culminando nos milagres atribuídos ao preto velho. Historia essa muito bem contada que, segundo o diretor, teve alguns excertos de ficção. Posto que, o objetivo da filmagem, fosse passar as dificuldades enfrentadas pela tumultuada vida de João de Camargo e seus problemas com a ordem religiosa católica sorocabana, tais metas foram alcançadas. Trata-se de um bom filme histórico.

Depois de uma breve introdução do diretor, antes da projeção, houve um debate sobre o filme ao término do filme. Paulo Betti ressaltou algumas questões sobre a baixa qualidade do áudio da sala. Nesse momento, começaram as discussões sobre a relevância de assistir cinema nacional, como uma forma de valorizar os atores brasileiros que refletem nossa realidade. O diretor assumiu uma postura que fazia apologia às televisões comunitárias como meio de se passar filmes produzidos nas respectivas regiões. Defendia um processo de “capitalização” dos grandes artistas, no sentido deles buscarem carreira nas grandes capitais, pois estaríamos: “Longe demais das capitais”. Disse que uma pessoa havia o procurado com um roteiro de filme e que não tinha condições de levá-lo às vias de fato, pelos impasses materiais. Para solucionar esse problema, sugeriu ao roteirista ir em busca de câmeras digitais, e que na Holanda, havia um festival de cinema somente com roteiros gravados em câmeras de aparelhos celulares. Só não faz cinema quem não quer, resolvendo assim o parêntese aberto no primeiro parágrafo. Idéias brilhantes que nenhum interiorano seria capaz de desenvolver. Sorte a nossa de ter contato com esse tipo de pensamento por meio do diretor, que desceu à plebe com o fim de estimular a atividade artística.

É impressionante a dificuldade que um diretor de cinema tem para divulgar sua arte. Divulgou estatísticas que diziam que das duas mil salas de cinema existentes no Brasil, apenas cinco por cento passam filmes nacionais. Uma vez, quando foi ao festival de Burkina, na urgência de viabilizar recursos para a ida ao continente Africano, teve que angariar recursos com a Rede Globo, que, por sua vez, possibilitou o êxito do empreendimento. Respondeu algumas perguntas feitas pela platéia que, em coros uníssonos de palmas em atrito, tinha sempre a habilidade de interromper o discurso antes de sua conclusão, em virtude de eventuais frases de efeito. Praticamente: “Policarpos do século XXI”.

Findado debate, todos voltaram um tanto mais sábios para casa. Uma verdadeira aula de brasilidade e arte nos tempos atuais. Parabéns aos organizadores!