É lugar comum em qualquer discussão, sobre a relação entre a poesia e o povo, opiniões desairosas a respeito do gosto popular. Muitas vezes, dizem que a poesia é algo restrito aos grupos de intelectuais, os de gosto refinado, que sabem apreciar as intenções sagazes de um verdadeiro poeta. Já ouvi dizer até que a poesia é um privilégio de classe, na pós-modernidade o proletariado não tem condições e nem tempo para tais frivolidades; chamemos isso de discriminação estética.
Ante tais concepções, alguns questionamentos surgem de imediato. Não pergunto aos professores de Artes por serem eles os únicos a terem cadeira cativa no céu, por óbvias razoes de estética Renascentista; mas, professores de língua portuguesa, prestem atenção. Uma pessoa oriunda de uma classe social menos favorecida, que trabalha catorze horas por dia, não tem o primor suficientemente elaborado para apreciar uma poesia de qualidade? Para tanto, vou tentar esboçar, com o respaldo teórico de Octávio Paz, em “O Arco e a Lira”, as definições de poema e de poesia, pois, nesse caso, parece ser a confusão para se afirmar tamanho disparate.
Para caracterizar-se um poema, é necessária a métrica, que são as regras da língua do poeta que exprimem o conhecimento da arte da versificação. O autor ainda completa dizendo que o poema é uma obra que envolve um algo a mais. Um soneto elaborado com todos os rigores de uma métrica sofisticada mostra-se como uma belíssima obra sem ser, em si, um poema, contudo, não deixa de ser forma literária – dotada de estrofes, metros e rimas. A poesia é que transformará essa forma literária em poema.
Ah a poesia! Octávio Paz deixa à poesia um status de grau elevadíssimo, em sua célebre definição e distinção entre poema e poesia. Dirigida à sensibilidade, a poesia é a celebração do ser humano que se revela, plenamente, no poema. Pode haver poesia sem poema, em manifestações sem métricas que toca o que o ser humano ainda tem de humano. Fusão perfeita entre forma e substância, o poema é uma estrutura literária que encerra a completude poética.
Imaginem uma banda de punk rock. Os integrantes ao comporem ou selecionarem uma canção, para seu repertório, estarão ocupados em harmonizar o conteúdo poético da canção, com o poema e o arranjo musical. Por serem músicos, normalmente, o aspecto musical vem em primeiro lugar. Jamais esperem de uma Plebe Rude um soneto nos rigores de Camões, natural é de fato uma melodia crua como forma de mostrar sua poesia, depois vem a letra. O mesmo se aplica aos outros gêneros musicais de canções populares.
Então, ao se dizer que a poesia é um privilegio de classe, se afirma também que um sujeito abastado é mais ser humano do que um desfavorecido economicamente. Toda pessoa gosta de poesia, entretanto, se não prefere ver sua revelação plena como no poema, não quer dizer que o gosto dela é inferior ou superior ao de outrem. É apenas diferente. A diversidade artística é a marca de toda sociedade democrática. Não vamos subestimar as preferências artísticas e poéticas por seus gêneros, mas sim por seus conteúdos. Critério de conteúdo seria tão somente qualquer tipo de descriminação social, cultural ou racial. Se não isso... Um brinde à poesia!
domingo, 27 de janeiro de 2008
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